Que caminhos seguir nesta crise planetária?

É um susto ler a noticia de que a experiente, cautelosa secretária-executiva da Convenção do Clima (ONU), Christiana Figueres, ao ser entrevistada pela rede de televisão BBC, perdeu o controle e desabou em pranto incontido, após afirmar que a falta de acordo global para conter emissões que contribuem para mudanças climáticas "está condenando as futuras gerações, antes mesmo que elas nasçam". E isso, a seu ver, "é absolutamente injusto e imoral".

Se nem uma diplomata no mais alto nível consegue ocultar a emoção e cai no choro, que pensarão os cidadãos no mundo todo? - ainda que ela diga não perder a esperança num acordo global (em Paris, 2015) para conter emissões, porque estamos "nos movendo lentamente, mas na direção certa".

A entrevista aconteceu poucos dias depois de 800 mil pessoas haverem sido retiradas de suas casas no Estado indiano de Odisha, ameaçadas por um ciclone. Um quarto dos seres humanos (mais de 1,5 bilhão de pessoas) está "em risco", principalmente a população de paises "à beira do Golfo de Bengala", na Asia (incluindo índia, Banglaciesh, Sri lanka, Mianmar, Tailândia, Malásia e Sumam), por causa dos chamados "eventos climáticos". Mas, como disse a secretária-executiva Figueres, as negociações caminham — quando caminham — muito lentamente.

E no ano passado, segundo a Agência Internacional de Energia, o financiamento de projetos que reduzam emissões não passou de 60% do que a Convenção do Clima considera o mínimo necessário para conter o aumento da temperatura em 2 graus Celsius. Até 2020 seriam indispensáveis US$ 5 trilhões. E ao longo de mais tempo só o setor de energia precisará investir US$ 19 trilhões.

E nós, por aqui? Diz o cientista José V. Marengo, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), um dos mais informados sobre clima (ele foi um dos autores do Quinto Relatório de Avaliação do Painel do Clima-IPPC), que nos últimos cinco anos o Brasil assumiu "um padrão de poluidor de Primeiro Mundo". O desmatamento caiu e a causa maior das emissões está na queima de combustíveis fósseis, especialmente por veículos. Mas a agricultura, a indústria e as termoelétricas, principalmente, também contribuem.

E o Grupo de Trabalho sobre Clima, do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais, em oficio ao Senado, alerta que o processo de revisão do Plano Nacional sobre Mudança do Clima, coordenado pela Casa Civil da Presidência, "encontra-se completamente prejudicado e fadado a um grande insucesso". A boa noticia é que o cientista Carlos Nobre, também do lime e do Ministério de Ciência e Tecnologia, foi convidado a integrar o Painel de Alto Nível para Sustentabilidade Global, que assessora o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon. Quem sabe, de lá, não conseguirá influenciar nossos padrões governamentais na área do clima?

Não é só nessa área que se sucedem notícias preocuparem em âmbito mundial. Estudo do Credit Suisse (Ethos, 24/10), um dos maiores grupos financeiros internacionais, diz que o nível de concentração de renda é espantoso, já que 0,7% da população global (menos de 50 milhões de pessoas) detêm 41% da riqueza mundial total, que é de US$ 241 trilhões (ficam com US$ 98,7 trilhões). Se a riqueza mundial fosse dividida igualmente, seriam US$ 51,6 mil para cada pessoa. Mas o Brasil está no grupo de países com renda média entre Se 25 mil dólares. A Austrália é o país com riqueza mais bem distribuída (219 mil dólares per capita). E os Estados Unidos, com o maior produto interno bruto, "têm um dos maiores índices de pobreza e desigualdade do mundo".

O quadro é ainda mais forte quando se foca a questão dos alimentos. Mark Bittman, do jornal The New York Times, depois de relembrar que quase 1 bilhão de pessoas passa fome, acentua que produzimos calorias suficientes para todas (2,7 mil diárias para cada), mas um terço serve para alimentar animais, 5% são usados na produção de biocombustíveis e "um terço é desperdiçado ao longo da cadeia alimentar".

Se aproximarmos os olhos da África, vamos ver que só no Congo (antigo Zaire), "em quase duas décadas, os confrontos no Leste do pais deixaram cerca de 6 milhões mortos", no "mais sangrento confronto" desde a Segunda Guerra Mundial.

Mas não adianta só ficarmos inconformados. É preciso propor e obrigar legisladores, em todos os níveis, a aprovar regras e padrões adequados para tudo. E criar ônus financeiros para quem os desrespeitar. Não há tempo a perder. Já temos problemas até com lixo espacial. E vamos começar a buscar recursos em outros corpos celestes.

 

Washington Novaes - É jornalista e um dos contemplados com o 10º Prêmio Dom Luis Gonzaga Fernandes
 

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